“A menina que não fui” marca estreia da Editora Ercolano
A Editora Ercolano fará o lançamento, em Goiânia, do livro A menina que não fui. Será no dia 27 de julho, às 18 horas, na Livraria Palavrear do Setor Universitário. Escrito por Han Ryner, o romance francês de 1903 é um precursor da literatura LGBTI+ que continuava inédito em língua portuguesa até agora. Para tornar essa noite especial, o evento contará com a presença do tradutor e editor do livro, Régis Mikail, com Roberto Borges, também editor da Ercolano.
Gênero e sexualidade são os temas centrais de A menina que não fui, romance polêmico francês traduzido pela primeira vez para língua portuguesa. “Ainda que outras obras ficcionais já tivessem tematizado as relações afetivo-sexuais em colégios internos, aqui certamente não se repete o recurso de botar panos quentes para não escandalizar.” João Silvério Trevisan, no prefácio de A menina que não fui.
A edição da Ercolano abre com o prefácio de João Silvério Trevisan, intitulado O Menino que era Rainha, em alusão à ascensão e ao declínio do protagonista François de Taulane, apelidado de “mulherzinha” e “rainha Françoise” pelos colegas que por ele sentiam tanto desprezo quanto atração. O olhar de Trevisan traz elementos-chave para atualizar a discussão sobre A menina que não fui, ressaltando sua pertinência para a contemporaneidade.
Na passagem do século XIX para o XX, a França vivia um conflito que se estende aos nossos dias: por um lado, a imposição de uma sociedade laica e, por outro, o enfraquecimento do catolicismo nessa mesma sociedade. Além disso, o discurso médico-científico e a então recém-nascida psicanálise passavam a ocupar o papel antes desempenhado pela religião.
Nesse contexto, o enredo de A menina que não fui se situa em grande parte na instituição de ensino Saint Louis de Gonzague, frequentada pelo próprio Ryner durante a juventude. Os diretores religiosos, em sua hipocrisia, são retratados não apenas como incapazes de sustentar a própria moral que pregavam, mas também como corruptos, sendo assim uma das causas da triste sina do protagonista e narrador em primeira pessoa.
Homossexual, François é atormentado por seus desejos e por um possível desconforto em seu gênero. Ele decide contar por escrito sua luta interior e todas as dificuldades que enfrentou por causa de seus amores e delírios. Assim como O Ateneu, de Raul Pompeia e Sébastien Roch, de Octave Mirbeau, os traços notavelmente intimistas e escandalosos do livro se distinguem dos chamados “romances de costumes colegiais” e, de maneira geral, da literatura de sua época.
A menina que não fui é apenas uma das muitas facetas de Han Ryner, pseudônimo de Henri Ner (1861-1938), que se aventurou nos mais diversos universos literários e abordou temas como a energia universal, o espaço e os alienígenas. Entre 1880 e 1938, Ryner publicou mais de 50 obras, entre elas ensaios, contos, romances, poesia e teatro. Transitou por diversos meios, como o círculo literário de Alphonse Daudet e os grupos anarquistas, nos quais atuou tomando a defesa de Sacco e Venzetti no famoso caso que condenaria ambos à morte. Entusiasta da filosofia grega, ganhou os apelidos de “Sócrates contemporâneo” e de “Príncipe dos narradores”, um tanto limitantes se considerarmos o caráter universalista do escritor.
Polêmico, Ryner tendia ao estranho e ao fantástico, à ironia e ao humor ácido, presentes em algumas passagens de A Menina que não fui. No entanto, sua natureza pacifista, que também pregava o amor livre, preconizava um individualismo não egoísta: sua noção de individualismo nada mais é que a liberdade interior, condição para a liberdade humana coletiva.
Em meio ao prazer da leitura, a obra também se experimenta desconforto. Não por acaso, causou escândalo quando foi publicada, e possivelmente, renovará os debates contemporâneos sobre gênero e sexualidade. Permanece a questão tratada no posfácio do romance: seria François uma personagem potencialmente trans antes de seu tempo, num século em que a homossexualidade era considerada crime e patologia, e a transexualidade, sequer contemplada?
Sobre a editora: A Editora Ercolano, fundada pelos editores Régis Mikail e Roberto Borges, chega ao mercado inspirada no arrebatamento através da experiência estética e tem a proposta de descobrir ou reencontrar publicações pouco conhecidas, injustamente esquecidas ou ainda não ouvidas. Com foco em obras literárias, dramatúrgicas ou musicais, nacionais e internacionais, os dois primeiros lançamentos são: A menina que não fui e Manet no Rio.
FICHA TÉCNICA
TÍTULO: A Menina que não fui
AUTOR: Han Ryner
TRADUÇÃO: Régis Mikail
PREFÁCIO: João Silvério Trevisan
ILUSTRAÇÃO: Felipa Queiroz
PROJETO GRÁFICO: Estúdio Margem
PREÇO: R$ 116,00
Fotos do lançamento do livro em São Paulo: Mayara Barbosa
Com: Beatriz Reingenheim
Amei! Não vejo a hora de celebrar o lançamento dessa obra prima!