segunda-feira, 16 de setembro de 2024

Peixe frito com feijão preto, caldo de cana de sobremesa e o socorro dos Bombeiros

 

Marcio Fernandes – Estou de novo em Florianópolis, cidade que não tem nada de convencional no Brasil. Primeiro, porque se trata de uma ilha no Oceano Atlântico Sul. Segundo, os motoristas param na faixa de pedestre pacificamente. Terceiro, o povo é de longe o mais bonito do país, especialmente pela predominância do elemento açoriano, chamado Manezinho da Ilha, que determina o modo de vida despreocupado da cidade.

 

Florianópolis é muita limpa e há uma tendência de cumprir as normas ambientais aparentes. Devido ao relevo acidentado e a presença de Mata Atlântica, a capital de Santa Catarina se divide em várias cidades com distâncias que superam os 40 quilômetros uma das outras. O transporte público, centrato nos ônibus, funciona a contento, embora há sinais de adensamento urbano irresponsável em toda ilha e bairros de moradias precárias no alto dos morros.

 

 

Já estive por aqui algumas vezes e nunca observei sinal de violência urbana. Aliás, praticamente não se vê policiamento ostensivo nas ruas e a carona é meio de transporte absolutamente normal na cidade. Para quem gosta de esporte outdoor, aqui é uma Meca profana e abusada para trilheiros, escaladores de montanha e, especialmente, surfistas de todos os gêneros.

 

Eu vim aqui a trabalho socorrer um camarada meu de Portobello e comer chocolate crocante à noite com a porta da varanda aberta só para curtir o frio do vento sul que sopra com toda elegância argentina. A temperatura cai abaixo dos 10 graus depois que o sol se põe e isso é algo fantástico para quem vem do Planalto Central seco e fervente de calor nesta época do ano.

 

 

Ontem decidi fazer trilha no sentido Rio Tavares – Costão de Pedras da Joaquina. A distância não é longa, mas o terreno acidentado das dunas, somado aos nove quilômetros de caminhada acumulados, me deixaram meio moído depois de banho quente e demorado. Durante todo o percurso de quase duas horas, eu segui no sentido norte tendo o Oceano Atlântico como companhia.

 

Nesta área que compreende a Praia de Campeche, o mar aberto é insolente e atrevido. As ondas desabam bravas na areia limpa, trazendo uma espuma densa de águas geladas. Se resolvesse nadar mar adentro em linha reta, em alguns meses de flutuação eu chegaria à África. Para encurtar o caminho, resolvi reverter o trabalho de milhões de anos de formatação geológica da terra. Reunifiquei os continentes e recriei Pangea só para caminhar sem tocar na água gelada.

 

 

Um casal de quero-quero, em ato de xenofobia, me trouxe de volta à realidade das dunas da praia ao acusar, ruidosos, que eu era um intruso nada bem-vindo no território insular. Encontrei também um pardal vadio, sem ter muito o que fazer naquele ambiente de ventos cortantes. Logo, ele deu o fora ao perceber a presença de três gaviões famintos planando nos últimos raios de sol em busca de jantar.

 

A culinária de Florianópolis é famosa por oferecer ostra de alto padrão e um prato chamado sequência de camarão. Eu até gosto mais ou menos de ostra, mas não como camarão porque a Bíblia proíbe e não vou muito com a cara do bicho. Antes da trilha, fui a pé descolar um prato-feito que o Manezinho da Ilha se alimenta no cotidiano.

 

 

Estava muito bom aquela fartura de comida com o melhor vinagrate da América Latina. No prato principal, arroz não tão bom, peixe frito com feijão preto de acompanhamento e farofa de mandioca. Comi regiamente, mas bateu uma fome grande na saída do restaurante pé-sujo. Fui obrigado a tomar um copo de 500 ml de caldo de cana da melhor qualidade.

 

No final da trilha, quase sem luz do sol, eu cheguei à Praia da Joaquina meio apurado com medo de me perder na escuridão da restinga. Não tive a menor dúvida de pedir carona ao pessoal do Corpo de Bombeiros até a estação de ônibus da Lagoa da Conceição. Único problema foi na hora de comprar a passagem de ônibus. No guichê, o cobrador perguntou minha idade e disse que por pouco eu perdi a isenção de idoso maior de 65 anos.

 

Marcio Fernandes: fotografias e texto

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Este post foi escrito por: Marcio Fernandes

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