terça-feira, 3 de dezembro de 2024

A amável senhora que dava Rivotril para os gatos

 

Marcio Fernandes – Estou com problema sério causado pela população de gatos que se mudou para a casa mais antiga de Goiânia, no bairro de Campinas. O imóvel tem fácil uns 150 anos. A princípio, eles eram dois. Agora são oito excomungados por todo lado no casarão. Eu Acho gato um bicho dissimulado e aproveitador de idoso.

 

O Brasil é um país muito engraçado e hipócrita nos dois extremos da direita e esquerda. Rigorosamente, ninguém dá a mínima para os mais de 40 mil homicídios que ocorrem todos os anos no bananal desalmado. Quando se trata de um bicho, pelo o qual não tenho a menor estima, a coisa vira caso de polícia e manchete nos jornais. E ainda tem o tratamento humanizado prometido pelo plano de saúde. Ué, se não for humanizado tem de ser veterinário.

 

Caso alguém manifeste solidariedade aos gatos, posso doar três deles. Se a situação for de revolta com minha oposição em relação ao bicho doméstico, me prontifico levar os oito felinos até o seu domicílio com a gentileza de um entregador de pizza em dias chuvosos. Se você ligar agora, tem a bonificação de uns 15 vasos de cacto, preguiçoso e inútil como os gatos, que está à beira da devastação ambiental na casa do Beco do Sapo, em Pirenópolis. Eles esperam uma alma zen, dessas que abraça árvores, para adotá-los.

 

Definitivamente, acho planta ornamental a coisa mais sem utilidade do planeta. Planta tem de dar fruto ou folha, igual aos pés de cajá-manga, boldo, jambo e tamarindo no quintal do casarão. Não vou dizer que as plantas do Beco do Sapo dão um trabalho danado para serem regadas ou podadas, pois não dou a mínima. Não há planejamento de morte dos cactos, apenas não me sinto com a menor obrigação de fazer o serviço.

 

Imaginei que seria moleza recolher os gatos e levá-los para Rondônia. Não é. Os bichos são malandros, criados na rua, e escalam o muro quando você tenta capturá-los, me disseram. Pensei em tudo e não encontrei uma solução viável. Armadilha de passarinho, ratoeira, gás paralisante foram algumas das iniciativas imaginadas. Quem sabe uma ONG especializada em gatos propagadores de bactérias não poderia me socorrer?

 

Nestes momentos sinto certa saudade da minha mãe. Como uma Melo legítima, ela era capaz de realizar os atos preparatórios e executar uma maldade com muita providência. O pessoal do Bolsonaro deveria se inspirar naquela doce e criativa velhinha na próxima vez em que for promover uma intentona.

 

 

Ao conversar com a Guilhermina sobre o formidável destino que deveria ser reservado aos gatos, alguém sugeriu dar um calmante aos bichos e assim realizar sem dor o procedimento de transporte dos animais para a Venezuela, justamente no dia da reeleição do Maduro. Guilhermina faz o melhor biscoito de queijo do Planalto Central, tipo orelha, moldado no garfo. Ela não se incomoda com os gatos e pensa que o melhor destino seria Rondônia: “Eles, pelo menos, vão ficar no nosso Brasil”.

 

Logo minha irmã me ligou morrendo de rir da ideia ventilada do calmante para gatos: “Não vai funcionar. Muito tempo atrás, quando houve outra infestação de gatos de rua no casarão, minha mãe tentou isso e não deu em nada”.

 

Ao contar uma das poucas maldades malsucedidas da minha mãe, Andrea me disse que ela, mais de uma vez, colocou generosas gotas de Rivotril na comida dos gatos, mas os bichos foram viajar no telhado e voltaram para a casa materna lambendo os bigodes por mais uma quantia do medicamento de doido.

 

Em seguida foi posta em execução uma atitude mais química para ela se ver livre dos gatos. Deu certo, mas eu não posso comentar a metodologia aplicada para o bem da consciência protetora dos animais.

 

 

Marcio Fernandes é jornalista

Este post foi escrito por: Marcio Fernandes

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