Pesquisas eleitorais estão entre incompetência e crime
Demóstenes Torres — Se as pesquisas estivessem corretas, quem teria sido o vencedor na eleição municipal em sua cidade? Onde moro, Goiânia, havia delas para todos os gostos, gastos e gestos. Acabou que o 1º colocado, Fred Rodrigues, sequer transitava entre os favoritos. O Poder 360 publicou uma tijolada, na segunda-feira, 7/10, “Compare o resultado das urnas com pesquisas nas 10 maiores capitais”. Imagine no interior…
Os escândalos seriam de dar cadeia num país sério. Na antevéspera, o instituto Atlas deu 20% a Ricardo Nunes, o prefeito que tenta a reeleição em São Paulo. Da apuração, Nunes saiu com 29,48%, quase 10 pontos percentuais e 50% a mais do que o instituto garantiu. Enquanto isso, DataFolha e Quaest, na véspera da votação, viram o apresentador José Luiz Datena com mais que o dobro do obtido, falha igual à que o Atlas cometeu em favor da economista Marina Helena: falou 4, vieram 2. Por 1 voto se pode decidir quem vai administrar 12 milhões de pessoas da megalópole, 1% é coisa demais para se aceitar.
Nos grotões, as notícias são assustadoras. Nada a fazer. As vítimas procuram socorro no Ministério Público Eleitoral e no Parlamento, já estive em ambos e fui incessantemente procurado. Nada havia a fazer. Contratam advogados. Nada podem fazer. Será que realmente nada há a fazer? CPIs e operações policiais, que geralmente dão em nada, dão em nada porque são feitas para darem em nada. Flagram um bagrinho aqui, uma piabinha depõe acolá, dois lambarizinhos indiciados no raso, porém nada de profundo. Os grandões estão por aí tão ricos quanto impunes, contratantes e contratados.
Existem critérios, todos mais frouxas que calça de palhaço. Os algozes devem rir de exigências “duríssimas” como ter de registrar a pesquisa, com lapso temporal para exibir os dados… Um circo, na pior acepção do termo. Sobram sugestões, como impedir a divulgação dos levantamentos na semana ou até na quinzena da eleição. Ou responsabilizar eleitoral e penalmente em casos de erros grotescos, com indenizações imensas, calculadas pelo orçamento do órgão pretendido. O problema é que para isso passar no Congresso seria necessário convencer centenas de beneficiários das patacoadas (ou delitos) dos institutos.
Os perdedores estão sem mandato, pois a tática é a de sempre: elas vão inflando os números, a massa se rende a quem está com mais possibilidade de vitória e os compradores dos índices acabam próximos deles. E, ainda assim, alguns se espatifam ante a vontade popular. Entre as tabelas comparativas do Poder 360 está a referente a Porto Alegre. A poucas horas de digitarem seu binário predileto, os gaúchos viram as informações do Atlas: Sebastião Melo 36%, Maria do Rosário 30%, Juliana Brizola 26%. O eleitor foi forçado a crer num empate triplo ou algo putrefato parecido. Na verdade, o atual prefeito obteve 49,72%, Rosário 26,28% e Brizola, 26%. A outro concorrente, Felipe Camozzato, previu 8% e ele não chegou à metade disso. É óbvio que influenciou o resultado. Melo ficou a mísero 0,28 ponto percentual de vencer em 1º turno numa cidade que precisa de estabilidade, inclusive política, para se levantar com urgência das tragédias que a tantos prejudicaram. Sem o tropeço (ou trapaça) dos institutos, nem haveria 2º turno contra quem recebeu uma ajudinha de 3,72%.
Por ser ciência, a estatística oferece técnicas seguras para captar dados. O que os institutos fazem com eles é que são elas. O entrevistado troca de humor entre o momento em que é abordado e o da votação? Sim, mas é necessário ser idiota para acreditar em mudanças tão bruscas que destroçam os 8% de Camozzato na pesquisa e os entregam esmagados nos 3,83% que apareceram nos boletins do Tribunal Eleitoral. E os equívocos são democráticos, esquartejam sem olhar ideologia. Camozzato é do direitista Novo. O prefeito de Recife, João Campos, do esquerdista PSB, deitou em 68% e acordou com 78,11%.
Incompetência ou crime? Quando o velho e bom (para alguns) Ibope dominava os recolhimentos de opinião, o Brasil sabia quem era o dono (Carlos Augusto Montenegro) e que, em caso de diferenças gritantes, nem precisaria gritar, ele viria a público oferecer explicações. Incompetentes ou criminosos, seus sucessores no ramo estão exatamente nem aí para Sua Excelência, a democracia. Sim, em último caso, é ela a esfaqueada nas costas.
Há o que fazer. A distância da eleição é um dos itens, talvez de dez dias. Punir criminalmente a discrepância, se premeditada. Investigar com rigor a promiscuidade entre institutos de pesquisa, partidos e candidatos, com reprimenda no bolso e na liberdade. Afinal, o que está em jogo é a diferença entre a bola bater na trave na decisão da Copa do Mundo e adiar o sonho por quatro anos ou ultrapassar a linha do gol. Sem VAR.