sábado, 4 de outubro de 2025

Tirana: tem nome de ex-mulher, mas é uma uma delícia de lugar para se comer

 

Marcio Fernandes – Tirana, capital da Albânia, é uma cidade gastronômica muito pouco visitada até pelos europeus. Eu desconheço outro lugar no Velho Continente que tenha tanta concentração de cafés. Para não falar da profusão de restaurantes que fundem a tradição milenar balcânica às influências das cozinhas italiana, grega e turca que, isoladamente, já são alguma coisa espetacular.

 

Até o frango assado em televisão de cachorro tem um bom lugar na mesa e, acreditem, combina com uma salada de folhas e legumes cheia do cheiro da terra de tão frescos que estavam. Os ingredientes ganham ainda mais notoriedade por serem banhados com o azeite de oliva monovarietal das azeitonas da casta Kalinjot, cultivadas no sul do país, e conhecidas pelas diferenciadas notas sutis de amargor e a colocação vibrante.

 

É verdade que os espetos metálicos estavam pelo menos uns três séculos sem receber qualquer higienizacão e as unhas da mão do assador de frango uns 256 dias sem corte, o que certamente foram um importante fator para agregar sabor à iguaria. Quando soube que eu era brasileiro, ficou em uma felicidade danada e me mostrou um vídeo postado por um jornalista nacional na Internet no qual ele e as penosas assadas eram o tema principal.

 

 

Para se entender o segredo da qualificada e muito simples culinária albanesa não é preciso muita pesquisa nem andar longas distâncias. A resposta está nas bancas de verduras expostas nas ruas da cidade e nos açougues muito bem-arrumados de Tirana. É tudo muito vinculado ao ambiente das planícies que cobrem o sopé dos Alpes Albaneses, uma majestosa cadeia montanhosa que mantêm na terra os odores e sabores vindos do Mar Adriático.

 

É claro que a profusão de sabores agregada a uma costeleta de carneiro, por exemplo, é derivada da tradição albanesa de ter o seu modo peculiar de tratar, temperar e cozinhar o produto a partir de especiarias que estão muito distantes da realidade das Américas.

 

 

Eu nunca poderia imaginar que houvesse pistache cor-de-rosa, mas a Britz Lopes, excelente cozinheira, e de curiosidade acima da média, o encontrou em banca de especiarias no Novo Bazar, mercado principal de Tirana. Apesar do mau humor cheio de razão da proprietária do negócio, uma vez que turistada sai fotografando sem pedir autorização, ela conseguiu obter alguma informação do produto.

 

Por falar em pistache, eu particularmente tive extraordinária experiência gastronômica com a semente natural, que na Albânia é mato, nas dezenas de sorveterias da cidade. Entendo que um dos fatores fundamentais de uma civilização é a capacidade de produzir sorvetes qualificados.

 

 

Mas não parei por aí. Em fenomenal restaurante italiano de Tirana pedi um linguine com pistache e camarão. Embora não coma frutos do mar foi só para saber aonde ia dar tal a nada convencional combinação. O prato ficou na relação das ótimas lembranças da capital da Albânia.

 

Outra coisa que ressalta no país é a qualidade das águas minerais vindas das montanhas. É alguma coisa de se beber de joelhos, expressão própria da Britz, e que entendi agora a mais completa tradução. Os vinhos também são excepcionais, embora nada baratos se comparados com os portugueses. Os mais aclamados são da casta Cabernet Sauvignon, Melot etc, produzidos pela Duka Winery.

 

 

O jornalista albanês Endrit Sauku, que conhecemos nas ruas da cidade, nos disse que o proprietário da vinícola é o presidente da Federação Albanesa de Futebol, Armand Duka. Como detesto futebol, caso ele me convide para régio jantar podemos conversar sobre vinhos e talvez discutir a questão  de saneamento do país que, sinceramente, precisa de uma melhorada boa para alcançar o padrão europeu. Em matéria de coleta e tratamento de esgoto eles estão mais ou menos em nível maranhense.

 

 

De acordo com Ranking Internacional do Suco de Laranja (Global Orange Juice Index), por mim criado em 1998, o produto israelense de uma banca de rua situada em Tel Aviv permanece em primeiro lugar. Já o suco da capital da Albânia, espremido com caldo de mão, passou a ocupar a segunda posição, justamente por ter uma espessa espuminha não encontrada em outro local do planeta. Tirana pode ter nome de ex-mulher e lembrar coisa ruim, mas é absolutamente deliciosa.

 

Marcio Fernandes é jornalista

Fotografias do autor

Este post foi escrito por: Marcio Fernandes

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