Um lugar puro e generoso chamado Kutaisi

Estou na terra Josep Stalin. Meu Deus, como a Geórgia de gente tão doce pode ter dado berço para um cão tão parvo?Ex-República da falecida União Soviética, que eu tanto venerei no passado por conta de avô e pai marxistas, por aqui foram varridos para o entulho da história qualquer sinal da dominação stalinista. Até os edifícios do horrendo realismo socialista estão em estado de esquecimento.

Cheguei em Kutaisi desde Roma em voo que deveria ter se iniciado em Madrid. A mudança estratégica de origem foi determinada pelo meu manezismo em movimento. O voo estava marcado para partir da capital espanhola dia 7 de junho, mas imaginei que a data era dia 8. Como também troquei o dia de nascimento da Manuela. Não perdi o voo! Perdi o avião inteiro, a noção do calendário, o rumo, uns euros, a paciência!

Depois, mandei às favas a conta prejuízo de tempo e grana me divertindo muito por uma noite em Trastevere! A fila anda! Marcelão, muito obrigado pelas dicas preciosas do bairro romano. Francesca e todo pessoal da região, nosso jantar foi um espetáculo! Em indo a Goiânia me procurem! Vou levar vocês ao Bar Glória para comer o internacionalmente conhecido Filé a Osvaldo Aranha! Não preciso mandar positivo. Vocês sabem do bem que me fizeram quando eu estava meio down!

A Geórgia é um país absolutamente lindo que hoje tem orgulho da liberdade e ter legado ao planeta a descoberta do vinho. Conheci a linda e de coração macio Sofia. Ela que me chamou para conversar no Mosteiro de Ghélati no alto de colina depois de eu receber a bênção do patriarca do templo Cristão-Ortodoxo, mesmo confessando a ele que era mais pra fraco em assuntos de Deus e religião. Nossa! Aqui tem água benta que jorra de fonte e todo mundo bebe no mesmo copo!

Sofia me contou a história da Santa Cristiana, também conhecida Santa Nina, que veio para o Cáucaso dar continuidade ao trabalho de seu tio São Jorge na criação do cristianismo para o triunfo do mundo Ocidental.

Nesta terra montanhosa, o povo é puro, de gentileza espontânea e sofrimento do dia a dia superado pela fé e força incríveis na presença originária de Deus. E como são lindos e amigáveis sem praticamente falar outro idioma se não o georgiano! Ainda que você tropece nesta gente de genética preciosa e única eles te pedem desculpas! Onde eu estou ao vir de um lugar no qual os carros mandam nas pessoas e parlamentares roubam dinheiro de merenda escolar para que as crianças comam lixo nas ruas? Como me disse Darcy Ribeiro em entrevista há longos atrás, no Brasil não há um porco abandonado!

Quer tomar um café turco preparado no aquecimento de areia? Aqui tem! Quer mirar o horizonte de neve que não morre inclusive na chegada do verão? É longe, mas pode contar com isso também! Quer vinhos deliciosos de 8 mil anos de tradição? Venha para cá! Se quiser pode chamar a Geórgia de Passárgada!

Na terra do carniceiro dos Gulags, as vacas hoje curtem a liberdade de passear pelas faixas de pedestre e há aroma, não controlado pelo Estado, de especiarias da Ásia Central por onde que você passa. E uma fartura muito barata de frutos, flores e folhas desta terra fértil de gente honesta e graciosa. O georgiano não conhece a trapaça. Ninguém te furta, ninguém te engana, ninguém te leva para o mal caminho. A Geórgia é pobre se comparada a qualquer país europeu, mas não há imagem de miséria, favela ou violência do grande bananal que fala português ao Sul do Equador!

Em Kutaisi, eu provei um suco de laranja sensacional. Dona Carlota apareceu na cafeteria e me garantiu nunca ter bebido fruta tão doce, nem em Jerusalém. Caso a cidade se candidatasse a concurso de bolo, seria campeã mundial de todas estas maravilhas que crescem no forno.

Na saída do Monastério de Motsameta ganhei meu dia ao ser abordado por grupo de pré-adolescentes fascinados pela Seleção Brasileira. Sabiam mais que eu de Pelé etc. Na saída, acenei para a galerinha do carro e eles sentiram o máximo por terem descolado amigo do Brasil!

Eu escrevo ouvindo Let it Grow e assim eu vou na noite fria ouvindo música linda de quem divide comigo estas terras distantes na imensidão das nuvens da Ásia Central. Eu voo porque o vento me empurra para além das montanhas da Geórgia e dos vales profundos onde moram meus temores do longo caminho. Às vezes eles se confirmam e me fazem perder o sono. Eu vou porque a fila anda e como é bom estar com quem me acompanha.

Agora eu vou descolar cama quentinha, amanhã tomar chá de hortelã da folha e comer bolo de vanilla. Seguir para Tbilisi sacolejando por cinco horas em trem da antiga União Soviética velho, sujo e lento.

Eliene, você é um anjo doido de pedra, mas sabe que te amo em português, inglês e italiano! Especialmente pela generosidade dos teus olhos azuis e por estar comigo aqui!

Querida Elisa, não se culpe por ser a menina mais linda de Massachusetts! Let It Grow! Só você sabe para aonde a tua fila anda.
Preciso mesmo mandar o positivo grande para Daniel. Filho, tinha me esquecido do teu aniversário! Estou no trem morrendo de saudades e chorando pra caraleo!

A música de hoje é Pássaro da banda O Terço! Estou meio borocoxô!

Texto e fotos Marcio Fernandes!