terça-feira, 12 de novembro de 2024

Esqueça Bolsonaro, lembre do trabalho

 

Demóstenes Torres — Na administração pública, a tática de criticar o antecessor só se explica pela ausência de realizações de quem o sucedeu. Quando os que eram da oposição tomam posse no governo, o estilingue troca de mãos. Difícil é colocar esse guizo no pescoço de alguns personagens do lulismo.

 

A ministra da Saúde, Nísia Trindade, por exemplo.

 

Tanta informação a ser passada aos milhões de brasileiros que se postam em frente à TV na noite domingo esperando a hora de dormir para enfrentar a semana, e a responsável por R$ 184 bilhões do Orçamento está preocupada com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Obras inacabadas ainda de governos petistas do início do século e a meta é o sujeito que saiu.

 

Tolera-se tamanha mágoa de quem perdeu nas urnas, ainda que as conteste; dos vencedores espera-se gestão.

 

O Executivo tem o dever de cuidar deste continente abençoado por Deus, não focar nas ilhas de calor. Deixar o ex-presidente com outras autoridades. E são muitas, algumas com sede de sangue, com faca nos dentes e machadinha na mão.

 

Fica aí meia Esplanada com dedicação exclusiva ao porrete. Parece haver um método. Integrantes da equipe se revezam para fazer no mandato o que executaram com eficiência na campanha, ou seja, amansar os amigos e amassar o grupo contrário. Alguns têm nível para fazer o contraditório, mas parcela da turma deveria ficar quietinha na folha de pagamento, encolhidinha no canto para evitar atenção a seu nome, senão a capivara vem ao sol – a referência não é ao roedor, mas à folha corrida.

 

Claro que uma profissional do nível de Nísia Trindade tem prestígio e cabedal suficientes para expor em rede de rádio e TV. Mas deveria usá-los em prol de sua área. Milhões de brasileiros se esquivam da imunização, Covid 19 continua matando, as demais doenças não dão sossego, hospitais destroçados e a ministra encontra tempo para se lembrar de trapalhadas do passado.

 

Não se questiona o fato de Nísia ser socióloga. O mais bem-sucedido ocupante da pasta na História do Brasil, José Serra, também não era médico. Pois, assim como seu xará Kubitschek, Juscelino Filho é médico, está nas Comunicações e sendo assado na fogueira das manchetes sem que categoria alguma o defenda.

 

Também não significa que Sônia Guajajara, Margareth Menezes e Ana Moser irão fracassar nos ministérios dos Povos Indígenas, Cultura e Esportes, já que são ultra ligadas aos respectivos setores. Camilo Santana é agrônomo, fez ótimos governos no Ceará e caminha para repetir o sucesso na Educação.

 

Enfim, a formação não se confunde com deformação e competência prescinde de diploma – o próprio Lula não possui (como Abraham Lincoln, que era lenhador e advogado autodidata) e Jair Bolsonaro só fez cursos militares (como Winston Churchill). A diferença é que Lula e Bolsonaro, como Lincoln e Churchill (e as comparações acabam por aqui) conseguiram nas ruas o apoio a seus projetos, enquanto nenhum desses lacradores se candidatou a ministro, superintendente ou diretor.

 

A outra explicação para o tiroteio é que auxiliares de Lula da Silva (PT)alvejam Bolsonaro mirando a própria ineficiência. Como suas atividades engatinham, o ministro língua solta corre atrás de quem se foi. Assim, o presidente teria ouvidos para a gritaria sem notar o silêncio do nada em obras.

 

Diversidade recebe holofotes, todavia ninguém pode reclamar de Lula quanto à diversificação. Escolheu o primeiro escalão na maior parte do país (14 Estados das 5 regiões). Nomeou indígenas, negros e brancos; homens e mulheres; héteros e homossexuais; ficha-limpa e nem tanto; novatos e experientes; direita, centro e esquerda; radicais e moderados; lulistas, ciristas e bolsonaristas. Eis o retrato das peças. Falta engrenar a máquina.

 

Nada a impede de andar de lado, todos a impelem a seguir em frente. A começar de quem manda. A fixação no adversário não é tarefa delegada pelo chefe. Aliás, Lula exige muito pouco da tropa. Carece nem ter ideia. Genialidade? Muito menos. Comandante mais gente fina que isso, esqueça, não existe. Antes, esqueça o inimigo, pois “tá na hora do Jair já ir embora”, mas o PT o não deixa se distanciar.

 

Crimes do 8/1 são imbróglio para o Judiciário. Comissão Parlamentar Mista de Inquérito é exclusividade do Congresso. Executivo precisa prestar atenção é no serviço, pois neste momento existem 8 milhões e 511 mil quilômetros quadrados de coisa nenhuma acontecendo. É só fake news, intriga, fofoca, redes sociais, briguinha não sei aonde de não sei quem por não sei o quê. “Trabalhar que é bom, nada”, resumiu a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.

 

Falar em mulher que representa bem a nação, Janja brilha no exterior. Sobressaiu-se na coroação do Rei Charles III com sua alegria, elegância e porte. Fez mais pela imagem do Brasil que décadas de diplomacia. Lidera, opina, interfere. Ainda bem. Os machistas da esquerda se roem de medo e inveja. Deveria ser o contrário: maior influência de Janja no pessoal dos palácios.

 

Está elogiável ainda o desempenho do lado do governo que age. Flávio Dino deveria ser o único a rebater os bolsonaristas, porque sobram-lhe argumentos e moral. Dois médicos se confirmam doutores em articulação, Alexandre Padilha com deputados e senadores, Geraldo Alckmin com investidores nacionais e estrangeiros. Carlos Fávaro é a revelação que vem do campo. José Múcio foi posto à prova desde o início e demonstra na prática que não haveria mais apropriada escolha para a Defesa. Rui Costa mostra ao Brasil os motivos de a Bahia eleger apenas duas pessoas: ele e quem ele apresenta.

 

Outros estão passando de hora de brincar de vaca amarela. Márcio França apanhou o gigantesco abacaxi de portos e aeroportos. Como o descasca? Arrumando encrenca com o aprovadíssimo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. Paulo Teixeira, em vez de abaixar o facho do Movimento dos Sem-Terra, defende quem mais afeta o Governo Lula 3. Desenvolvimento Agrário tem de ser uma política pública sobretudo para a agricultura familiar, não somente o nome do ministério de Teixeira.

 

Chega de brincar de gato e rato, bêbado e delegado, mocinho e bandido, meia dúzia de espécies encontráveis em todo lugar, governo e oposição. O momento é de dividir entre quem faz e quem não faz, demitir quem não faz e obrigar quem faz a fazer direito, barato, bem feito. E pra ontem.

 

O que ilustra: O Juízo Final, de Michelangelo

Este post foi escrito por: Demóstenes Torres

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